65% pessoas não tolera a lactose. Mas pintá-la como vilã é um exagero, e abandonar os laticínios sem necessidade pode ser uma roubada para a sua saúde
Mayra Fernandes/Superinteressante
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A primeira coisa que você provou na sua vida foi leite.
Foi leite também a única coisa que você comeu até os 6 meses de idade, substituindo qualquer outra comida, bebida e até mesmo a água. É “leite que nunca azeda” o que jorra no paraíso muçulmano e é ele que existe em abundância na terra prometida dos judeus. Cleópatra se banhava em leite para ficar eternamente jovem. Segundo a lenda, Rômulo, o irmão de Remo, só fundou Roma porque foi amamentado por uma loba.
Hoje, o leite é o segundo alimento mais consumido do planeta – atrás apenas do milho – e nós brasileiros tomamos 60 litros desse líquido milagroso por ano. E ele é milagroso mesmo: um copo de leite de vaca tem os carboidratos de uma fatia de pão, as proteínas de um ovo, o fósforo de uma concha e meia de feijão e o cálcio de 1,4 kg de espinafre.
(Dulla/Superinteressante)
Recentemente, porém, o leite anda sofrendo de uma estranha má reputação. Cada vez mais pessoas estão se descobrindo intolerantes à lactose – e fazendo cara feia para pães de queijo, pizzas e outras delícias lácteas. A intolerância acontece quando o corpo não consegue metabolizar direito o açúcar do leite, a lactose. Resultado: gases, diarreia, cólicas, numa intensidade que varia de acordo com o grau da intolerância.
Assim como já aconteceu com o glúten, o ovo e a gordura animal, a lactose é o novo vilão da alimentação, e está perdendo lugar nas prateleiras dos supermercados. Segundo a Tetra Pak, o mercado de leite sem lactose cresceu 224% nos últimos três anos no Brasil. Nos EUA, ocupou um nicho de US$ 6,7 bilhões em 2015 – e a expectativa é que chegue a US$ 8,8 bilhões até 2020.
Os efeitos da intolerância não são agradáveis, mas o fenômeno não deveria ser novidade: segundo um estudo da Universidade de Uppsala, na Suécia, apenas 35% da população mundial consegue metabolizar normalmente a lactose. Em alguns países asiáticos e africanos, como a Tailândia e a Namíbia, só 10% dos habitantes digerem leite.
No Brasil, segundo uma pesquisa da Faculdade de Medicina da USP, 57% dos brancos e pardos, 80% dos negros e 100% dos descendentes de japoneses são intolerantes no Brasil. Ou seja, com base nos critérios de cor e raça do IBGE, temos que 60% da população apresenta algum grau de intolerância.
Mas, se o intestino de tanta gente não sabe lidar com o leite, como ele ainda é tão popular? E, se ele faz tão mal, por que não é cortado de vez da dieta? Para essas respostas, precisamos entender primeiro nossa longa vida de amor e ódio com esse líquido branco.
224% é o quanto o mercado de leite sem lactose cresceu no Brasil desde 2014.
Primeira Edição © 2011