Empurradores travam concorrência por R$ 30

02/03/2014 12:30

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Band.com

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Em fila, organizados, em silêncio, sem camisa e quase todos negros, os empurradores de carros alegóricos do Anhembi quase pareciam formar uma ala sobre o enredo sobre Dorival Caymmi. São eles, que não têm ligação com qualquer escola, que ajudam as agremiações que não conseguiram voluntários para o serviço braçal no Sambódromo. Por R$ 30 cada um, os empurradores vestem a camisa de uma escola por pouco mais de uma hora, para depois, em troca de mais R$ 30, "virar casaca".

"Até agora só consegui trabalho uma vez. É muito pouco", diz Marcos Paulo, 20 anos, após a passagem de quatro escolas. Ele é o único com camisa - na verdade, um macacão da Macidade Alegre -, usada para afastar o frio que causa incômodo após 15 dias de vida nova em São Paulo com clima mais próximo de sua Porto Franco natal, no Maranhão, cidade com pouco mais de 20 mil habitantes - bem menos que o número de pessoas que passaram em dois dias de desfiles no Anhembi.

"Eu saí de casa e passei uns dois dias em Goiânia. Fiz um amigo lá e ele veio junto comigo para São Paulo. Pra ver se melhoro a vida", conta ele, que mora em um albergue no Brás e ficou sabendo do bico no Anhembi "pelo pessoal da rua". A mãe de Marcos morreu há alguns anos, e ele não chegou a conhecer o pai.

O esquema de emprego informal no Sambódromo quase repete a dinâmica do mercado de trabalho formal. Em fila, os candidatos aguardam que um representante de uma escola apareça com a oportunidade. É ele quem escolhe quem vai empurrar o carro, baseado em poucos critérios, em que a força aparente tem peso maior. Os escolhidos ganham a camisa da agremiação e seguem para a traseira da alegoria. Ao fim do desfile, um representante da escola realiza o pagamento. O serviço, com o aumento do número de carros motorizados, vem diminuindo.

Quando a Nenê de Vila Matilde encerrava o desfile, um membro da Águia de Ouro apareceu com trabalho. A fila acabou e só se via dezenas de braços e mãos em busca de uma camisa.

Quem é escolhido corre para vestir a roupa em busca de mais R$ 30. Os preteridos, cabisbaixos, formam uma nova fila. Entre eles está Marcos: franzino, com frio e muita fome, que é aplacada com a distribuição de quentinhas de um restaurante que funciona dentro do Anhembi.

"Ontem eu trabalhei com quatro escolas. Hoje está fraco", diz Marcos, frustrado com o resultado do dia, só compensado pela farta porção de frango com farofa, comidos diretamente com as mãos.

"E o pior é que nem gosto de samba. Prefiro forró", encerra, resignado.

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