Ex-diretor do IML, Gerson Odilon faz “carta aberta” ao Governador

24/09/2012 05:42

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Marigleide Moura

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O ex-diretor do Instituto Médico Legal Estácio de Lima, Gerson Odilon, enviou para a imprensa neste fim de semana uma carta aberta para o governador Teotonio Vilela Filho. No texto escrito em forma de poesia, Odilon retrata várias dificuldades enfrentadas por quem trabalha no órgão.

Odilon foi diretor do IML por mais de 20 anos. Ele entregou o cargo em junho deste ano. Sua saída foi considerada o estopim da crise que se arrasta no instituto. Os médicos legistas há muito tempo reclamam das precárias condições do prédio na Praça da Faculdade, que abriga o órgão há quase 80 anos.

Na sexta-feira, uma nova greve foi deflagrada pelos legistas e os exames de necropsias e exames de conjunção carnal e corpo de delito estão suspensos em Maceió e também em Arapiraca. A paralisação levou a justiça a pedir a prisão do presidente do Sindicato dos Médicos de Alagoas, Wellington Galvão.

De acordo com a decisão do desembargador-presidente Sebastião Costa Filho, o sindicato deve pagar multa diária de R$ 10 mil e os corpos devem ser liberados para sepultamento com o registro cadavérico.

Leia a carta

 

Excelentíssimo Senhor,

Governador do Estado,

Ouça o grito de protesto

De um servidor revoltado

Excelência, isso é incrível,

É inteiramente impossível

Suportar tudo calado

Um pobre médico legista

Tem mesmo que ser artista

Pra não morrer engasgado

 

Como é que se admite

Que um profissional

Graduado em medicina

Tenha um salário tão mal!

Ganhar nem três mil reais

Já não se aguenta mais

Tamanha decepção

Deixe desse tra-la-lá

Que Alagoas está

Envergonhando a Nação

 

Como é que pode um doutor

Que atua honestamente

Ter menos de três mil reais

No seu salário indecente

Trabalhar sem condição

Viver a humilhação

Desonrando o próprio nome

Sem matar e sem roubar

Tendo contas pra pagar

Acaba passando fome

 

Quando o Tenente Bezerra

Acabou com Lampião

A autópsia não foi feita

Por falta de condição

Há 81 anos atrás

Ninguém suportava mais

Tantos corpos mutilados

Sem haver necropsia

Levaram para a Bahia

Pra serem necropsiados.

 

Hoje, tanto tempo depois,

A história se repete

Por ordem judicial,

Da doutora Elizabete,

Numa decisão louvável

Torna o IML inviável

À prática pericial

Por não ter laboratório

Raios-X, nem consultório

Pra exame sexual

 

A digna desembargadora

Tomou sua decisão

De fechar o IML

Por falta de condição

De funcionar direito

E mesmo assim desse jeito

Ninguém deu mínimo valor

Esperava toda classe

Que o senhor se pronunciasse

E aí Governador?

 

Na Medicina Legal,

Seu Doutor me dê licença!

O laudo pericial

É o “prefácio da sentença”

É quando o médico legista

Expõe seu ponto de vista

Legalmente amparado

É legítimo e legal

Pois o laudo pericial

É a lente do Magistrado

 

Quando a justiça tem dúvidas

Na clareza do processo

Pede uma autopsia

Pra decidir com sucesso

E pra ajudar na decisão

Existe a exumação

Pra que a dúvida não persista

E pra não ficar indeciso

Neste momento preciso

Atua o médico legista

 

Assim esse profissional

Propõe a sociedade

A promoção da justiça

Ao garimpar a verdade

Não sendo tarefa fácil

Faz do seu laudo um prefácio

De uma sentença eficaz

Com talentos soberanos

Brinda os direitos humanos

Com o trabalho que faz.

 

Meu Nobre Governador,

Estamos decepcionados

Pois no item “violência”

Nós ganhamos disparados

Nós lhe pedimos clemência,

Combata essa violência,

Tomara, meu Deus, tomara

Se não dermos passos certos

Os crimes vão ser descobertos

Na base do “pau de arara”

 

Governador, se oriente,

Tome as rédeas do Estado

Eu como Médico Legista,

Já estou decepcionado

Salve nosso IML

Cuide dele, limpe e zele

Nosso Instituto está mal

Mudemos esse conceito

Peço em nome do Direito

E da Medicina Legal

 

Governador, por favor

A outros não atribua

Para acabar esse impasse

A última palavra é sua

Assuma esse compromisso

Acabe logo com isso

Cumpra o que prometeu

Ao invés de imposições

Ofereça as condições

Olhe pra quem já morreu

 

Tenho que reconhecer

Que já me sinto vencido

Vejo-me de mãos atadas

Sem coragem e sem sentido

Mesmo assim ainda lhe peço

Dê início ao processo

Aja de outra maneira

Esse é o protesto forense

Do conterrâneo viçosense

Gerson Odilon Pereira

Primeira Edição © 2011